Não é exatamente uma homenagem ao "Senhor Diretas", de quem não cheguei a ser um fã, embora seja impossível não ter saudades dele diante da deterioração de nossa classe política. É antes uma reflexão provocada pela enxurrada de elogios ouvidos (somente) após sua morte e também, é claro, pelo seu peculiar e poético desaparecimento, no mar e sem deixar vestígios.
Aproveito para homenagear também meu caro amigo Irno Lenz, que há exatamente um ano partia, deixando também para todos que o conheceram seu exemplo de luta e integridade.
REQUIEM IV
para Ulysses Guimarães
Morresse hoje, e seria
santo e sábio e bom
e forte como só aqueles
— os que se foram — é que sabem
ser, agora que não são mais.
Morresse hoje eu, e sobre
a tumba em abundância correriam
lágrimas de quem me desprezava.
(e para que correriam hoje,
lágrimasque em vão tentei
arrancar com versos, cartas,
promessas, súplicas e ameaças
de strip-tease?)
Morresse hoje eu, de repente,
e afinal saberiam todos
que me amavam, e eram todos
por mim amados: de um só golpe
saberiam todos, com certeza.
Nuvens que pairavam entre nós
se desfariam, e tudo estaria claro.
Agora saberiam, e agora
seria como sempre havia sido,
exceto por uma coisa:
seria tarde.
Morresse hoje eu, e encontrasses
tu, meu amigo, em minha estante,
estes versos cheios de presságio
e julgarias enfim que me compreendes,
agora sim; que sou sublime,
agora que, de fato,
já nada sou.
agora sim; que sou sublime,
agora que, de fato,
já nada sou.
(Mas teria valido a pena,
ao menos, o tempo gasto
em escrevê-los...)
Morresse hoje, e os demais
habitantes do planeta,
esses bilhões de seres estranhos
(para não falar das pedras
do calçamento e do restante
do universo) nada sentiriam.
Isto é o que no fim das contas me consolará.
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